Cônsul Geral homenageado pela comunidade portuguesa

Aproximando-se a despedida de São Paulo do Cônsul Geral Paulo Lourenço, após seis anos à frente do Consulado Geral, a comunidade luso-brasileira juntou-se para prestar homenagem ao trabalho realizado pelo diplomata.

Na Casa Araújo Pinto – sede da Câmara Portuguesa – marcaram presença num jantar de despedida diversos elementos do Conselho da Comunidade Luso-brasileira de São Paulo, deputados portugueses e brasileiros, Presidentes das associações da comunidade portuguesa, cônsules honorários de Portugal em São Paulo e Mato Grosso do Sul, e membros da Câmara Portuguesa.

Por deliberação do Conselho da Casa de Portugal em São Paulo, foi atribuída ao Consul Geral a Comenda da Ordem do Mérito Infante Dom Henrique – a mais importante distinção da emblemática associação luso-brasileira, que é mesmo mais antiga que a comenda do mesmo nome existente em Portugal e atribuída pelo Presidente da República. [Foto abaixo]

De acordo com o seu regulamento, a Ordem em apreço tem “a finalidade de homenagear personalidades e instituições portuguesas e brasileiras que de alguma forma contribuíram para o intercâmbio luso-brasileiro e para a promoção e divulgação de Portugal, dos portugueses e valorização da Comunidade Luso-brasileira”.

A imposição da distinção foi realizada pelo ex-Presidente do Conselho da Comunidade Luso-brasileira, Comendador António de Almeida e Silva – em representação do Presidente da Casa de Portugal, António dos Ramos –, e pelo Ministro Celso Lafer, que foi também o preletor da outorga e prestou homenagem ao trabalho do Cônsul Geral no estreitar das relações luso-brasileiras.

Na mesma noite, o diplomata recebeu também do Presidente da Câmara Portuguesa, Miguel Setas, o título de “Conselheiro Honorário Fundador da Casa Araújo Pinto” [Foto abaixo], em reconhecimento de todo o trabalho realizado para a concretização desta sede da Câmara e no estreitar das relações económicas entre Portugal e o Brasil.

Na ocasião, o Cônsul Geral dirigiu algumas palavras a todos os presentes, que pode conferir abaixo:

Senhor Presidente da CP, e nosso anfitrião

Senhor Presidente do Conselho Deliberativo da Casa de Portugal

Senhor Presidente do Conselho da Comunidade Luso-brasileira de S.Paulo

Senhor Ministro Celso Lafer

Senhor Deputado Carlos Páscoa

Senhor Deputado Arnaldo Faria de Sá – na pessoa de quem saúdo autoridades estaduais e municipais presentes

Senhores Cônsules Honorários,

Senhores comendadores, senhoras e senhores dirigentes das nossas Casas e Associações,

Minhas senhoras e meus Senhores

Ocorre-me começar por lembrar o pensamento atribuído a Confúcio segundo o qual o silêncio é um amigo que nunca trai.  Mas a verdade é que a única forma que tenho de retribuir esta homenagem tão generosa é mesmo a de vos dirigir algumas palavras, elas que são. Embora singelas, a verdadeira “moeda” de um diplomata.  E as ocasiões especiais merecem sinceridades maiores.

Será porventura natural, após mais de 6 anos em funções, que tenha aqui deixado não apenas algum mérito digno de nota, mas sobretudo aquilo que me parece mais valioso na vida: os relacionamentos pessoais, as amizades e os vínculos que, espero sinceramente, poder manter e cultivar no futuro, onde quer que me encontre.

Nesta trajetória profissional e pessoal – e na carreira que escolhi, a distinção entre pessoal e profissional é muito ténue – momentos houve, testemunhados melhor que ninguém pela minha mulher Mafalda, em que a paixão de querer fazer e de querer fazer bem pelo país que represento e por esta orgulhosa comunidade quase me desumanizaram, no sentido em que me sentia tão animado a produzir mudanças na imagem do nosso país, a elevar o nosso perfil numa cidade tão competitiva ou de realizar aquilo que é a ambição intransferível de Portugal em S.Paulo, que me levavam a pôr um sentido de necessidade e de urgência nem sempre compatível com o ritmo das pessoas ou das agendas.

Mas em nenhuma circunstância me permiti prescindir de uma das maiores virtudes que esta carreira proporciona: não precisar de sacrificar amigos nem afetos no altar da Pátria, até porque ser CG em S.Paulo é uma honra rara que nos dá oportunidades únicas para cumprir ambas. Talvez por isso esta partida esteja a ser tão intensamente sentida por mim, pela minha família e pelos muitos e queridos amigos que aqui deixamos.

E como dizia Elbert Hubbard, “o amigo é aquele que sabe tudo a seu respeito e, mesmo assim, ainda gosta de você”.

Pelos diversos reconhecimentos de que eu e minha mulher temos tenho sido destinatários nas últimas semanas, não posso senão considerar-me infinitamente grato. Grato ao meu país que me proporcionou o ensejo de o representar aqui; grato à minha família que me acompanha e me dá ânimo; grato por fim à comunidade luso-brasileira que, nas suas várias dimensões, aqui nos acolheu com tanta generosidade e simpatia, tornando tudo muito mais fácil.

Mas dentre estas honrarias, não posso deixar de confessar que a distinção que me é feita nesta ocasião pela Casa de Portugal, a mais representativa de todas as agremiações portuguesas de S.Paulo, tem para mim um valor particular.

Por mais ativo e geralmente reconhecido que um Cônsul geral possa ser, o seu primeiro e último júri é a sua comunidade; é a ela que ele deve, em primeira mão, servir, porque servindo-a, cumpre a sua mais nobre atribuição enquanto representante do Estado português, cumprindo Portugal onde quer que ele esteja.

Não creio que se possa dignificar Portugal sem dignificar os portugueses, sem lhes proporcionar o melhor serviço público consular possível, sem os apoiar, sem os defender ou sem os compreender. Como sempre fiz questão de dizer, quanto mais forte for a Comunidade, mais forte é o seu CG; quanto mais forte o seu Consulado, mais poderosa é a comunidade. Sem qualquer pretenciosismo comparativo, que nenhum de nós toleraria, dá vontade de lembrar, em qualquer caso, Luis Vaz de Camões quando, nos Lusíadas, vaticinava que “um fraco Rei faz fraca a forte gente”.

Ser digno de receber da Casa de Portugal a sua maior distinção dá-me a certeza de que não terei desperdiçado totalmente estes 6 anos, nem desmerecido a honra, reservada a poucos, de servir a leal comunidade luso-brasileira de S.Paulo, que aprendi a conhecer, a compreender e a amar. Permanecerei para sempre reconhecido aos responsáveis associativos – e neste caso particular, ao Presidente da Casa de Portugal, Comendador António dos Ramos, assim como à sua Diretoria – por este gesto para mim tão significativo, tanto mais que o recebo das mãos dum dos mais importantes líderes de sempre das comunidades portuguesas no exterior, o Comendador António de Almeida e Silva.

Não poderia deixar, nesta circunstância, de lhe exprimir, uma vez mais, a minha sincera gratidão quer pelo apoio, lealdade e bom senso com que soube apoiar o melhor interesse de Portugal em S.Paulo enquanto Presidente do CCLB, quer pelos inúmeros depoimentos de amizade que me tem destinado.

Como já disse publicamente, mudam os governos, mudam os titulares de cargos públicos, mudam os cônsules gerais e os embaixadores, mas a maior prova de grandeza da comunidade luso-brasileira é a sua notável e distinta disposição para valorizar Portugal e a cultura portuguesa, com a mesma fidelidade e convicção. Esta é uma comunidade de pessoas, que vive de pessoas, independentemente dos partidos ou dos modismos.

Por isso, e sem prejuízo dos desafios com que muitas das nossas agremiações hoje se confrontam, parto de S.Paulo com 6 anos de algumas certezas feitas, entre as quais estas:

– que qualquer que seja o Cônsul em funções ou o governo em Lisboa, esta comunidade estará sempre pronta para ser o seu co-piloto e o seu parceiro. Estou por isso certo que esta mesma comunidade que me acolheu de forma tão fidalga, receberá com a mesma convicção o meu sucessor.

– ou a certeza, ainda, de que ela será sempre sentinela verdadeira dos valores profundos do nosso legado no Brasil, porque sem ela a integridade da nossa História e património ficam feridos de morte.

Testemunhei, nos últimos anos, uma revolução da luso-brasilidade e certamente a uma mudança de percepção de Portugal em S.Paulo e no Brasil. Estas transformações foram possíveis não apenas porque se vive hoje uma redescoberta do nosso país pelos brasileiros que em número crescente procuram a cidadania portuguesa, visitam, investem, residem, empreendem ou estudam em Portugal, mas também porque só buscando balanço no passado, na memória e na integração e capilaridade da nossa presença capilar – como se de um estilingue se tratasse – podemos desvendar, em toda a sua riqueza, a moderna e cosmopolita cultura portuguesa contemporânea. Não há, contudo, modernidade sem tradição. Assim como a tradição precisa da modernidade para se revigorar.

Ocasiões como esta proporcionam-se para dar testemunho de pessoas que nos ajudaram ou que nos marcaram. Não posso referir-me a elas todas, mas com a compreensão de todos, não posso deixar aqui de citar a importância que para mim se revestiu o conselho amigo e franco com que sempre pude contar de todos os integrantes do meu Conselho Consultivo, muitos deles aqui hoje presentes, assim como evocar algumas personalidades da comunidade sem as quais a minha experiência não teria sido tão enriquecedora.

E como dizia o Mário Quintana, há duas espécies de chatos: os propriamente ditos e os amigos, que são os nossos chatos prediletos. Permitam-me que seja, esta noite, se possível, um chato tolerável.

Evoco, se me permitem assim, a título mais pessoal, os Comendadores Jorge da Conceição Lopes, Fernando Prado Ferreira, João Caldas, Vasco Monteiro, José Duarte, Paulo Almeida, Rui Mota e Costa, Justo dos Santos, mas também o carinho e apoio que me dispensaram pessoas como Fernando Ramalho, Teresa Morgado, Antero Pereira, Luiz Martins, Mário Carvalho, Óscar Ferrão, Paulo Porto, assim como não posso deixar de agradecer a atenção que sempre encontrei no deputado Carlos Páscoa ou no agora “nosso” Grande Oficial da Ordem do Mérito Empresarial, Engº Miguel Setas, entre muitos outros, empresários, profissionais e dirigentes associativos que o tempo curto impede de citar, mas que o tempo se encarregará de reconhecer na altura própria, assim o espero, pelo seu inegável merecimento em prol da relação Portugal – Brasil.

Minhas senhoras e meus senhores,

De acordo com o seu regimento, a Ordem do Mérito Infante D. Henrique foi criada pela Casa de Portugal de São Paulo em 1944, com a “finalidade de homenagear personalidades e instituições portuguesas e brasileiras que de alguma forma contribuíram para o intercâmbio luso-brasileiro e para a promoção e divulgação de Portugal, dos portugueses e valorização da Comunidade Luso-Brasileira”.

Talvez a mais impressionante descrição do Infante D. Henrique esteja no poema lírico Mensagem, quando Pessoa o descreve da seguinte forma: “Com seu manto de noite e solidão” colocou “o globo mundo em sua mão”.

O Infante não é apenas História e passado verdadeiros, mas a metáfora permanente do que os Portugueses são capazes de operar, de conquistar ou de inovar – seja pela arte ou pelo engenho.

Como se já não bastasse a emoção deste agraciamento tão emblemático, quis a circunstância que o Ministro Celso Lafer aceitasse fazer a preleção da outorga desta Comenda, ele que foi tão justamente condecorado pela República Portuguesa com a Grã-Cruz da homónima Ordem do Infante D. Henrique em 2001 e que é, como sabeis, uma das mais destacadas e honradas personalidades da sociedade paulista.

Acredite, Professor Celso Lafer, querido amigo, que sou eu que estou em dívida para consigo, quer pelos abundantes gestos de amizade que teve para com Portugal ao longo da sua vida profissional e política, quer pela amizade e cordialidade que sempre em si encontrei, nas várias funções que desempenhou, designadamente quando presidiu à FAPESP ou mais recentemente na Fundação FHC.

As qualidades com que frequentemente me deparo no Brasil e nos brasileiros – a generosidade, a gentileza, a criatividade, o seu ânimo irredutível – e que me fazem continuar a acreditar nele – encontram documentada evidência no trajeto e na vida pessoal do Ministro Celso Lafer.

Observador apaixonado deste país, tive a sorte de poder conhecer de perto grandes figuras das letras, da cultura, da vida intelectual e da política brasileira. Essa foi para mim a verdadeira experiência informadora e formadora de opinião. Não é crível que o Brasil que tenha homens como Celso Lafer não esteja destinado à grandeza. Por isso continuo a acreditar no futuro deste país, ao qual Portugal está e permanecerá ligado.

A todos fico grato e a todos me declaro devedor. A todos, por fim, guardarei no coração e na razão, pela grata e inspiradora passagem por S.Paulo que me proporcionaram.

Obrigado.

Viva Portugal! Viva o Brasil!