Há um novo ciclo de empreendedorismo que passa por São Paulo
Na próxima segunda-feira celebra-se mais um aniversário da fundação de São Paulo, cidade cujos perfil e longa história continuam a oferecer pistas preciosas sobre os desafios ao crescimento e ao desenvolvimento sustentável. Ao longo do último século e meio, a relação entre Portugal e Brasil passou sem dúvida por aqui — de gerações de portugueses desembarcados em meados do séc. XX no porto de Santos aos expatriados mais recentes que aterram em Guarulhos ou Viracopos. Habituados a estarem em contraciclo económico, brasileiros e portugueses sempre se procuraram instintivamente, consolidando a sua presença como comunidades bem integradas.
Uma pesquisa local recente identificou os portugueses como a maior comunidade estrangeira residente em São Paulo, bem acima de migrações importantes como a japonesa, a italiana, a sírio-libanesa ou, a mais recente, boliviana. Nunca deixámos de viver e de trabalhar neste que é o estado mais populoso, cosmopolita e vibrante do continente Brasil. Os portugueses e os luso-brasileiros fizeram e fazem parte da transformação de São Paulo em economia moderna — da sua industrialização no século passado até à dominante economia de serviços.
Nunca deixámos de aportar, de forma mais ou menos vigorosa, a este exigente mercado, nos bons e nos maus momentos. Mais do que a língua, há um código partilhado e uma cumplicidade que nos diferenciam, mesmo quando a abordagem empresarial é reconhecidamente difícil. Se há 15 anos, se vivia aqui o advento das multinacionais portuguesas, hoje as circunstâncias mudaram: aumentou o IDE e o turismo brasileiros em Portugal, bem como o número dos que ali têm residência física ou fiscal.
Enquanto isso, são as PME e startups portuguesas, nomeadamente de última geração, que aqui procuram sócios e consumidores. É um ciclo novo que precisa de ser bem interpretado, compreendido e apoiado. Em ambos os países, as PME são hoje as principais responsáveis pela geração de emprego. E Portugal, que vive um período auspicioso como incubador de novos negócios, pode encontrar no Brasil circunstâncias mutuamente vantajosas.
Com dezenas de voos semanais da TAP, um trânsito significativo de turistas, empresários, artistas e estudantes — e um número crescente de cidadãos brasileiros com nacionalidade portuguesa — o potencial bilateral de negócio é mais circular e de via dupla. A internacionalização das empresas passa por lograr espaço para ambos, longe do esquematismo das balanças comerciais.
Por outro lado, convém não perder de vista as oportunidades que se escondem por trás do modismo pessimista que, dentro e fora do Brasil, se abateu sobre ele. O mercado brasileiro não ficou mais exigente do que sempre foi e o Brasil fará sempre parte do nosso itinerário enquanto país e economia. Os investidores estrangeiros que olham no longo prazo sabem que as instituições no país são fortes — como o demonstram os processos judiciais em curso — e os pilares económicos resistentes. Não por acaso, investiram aqui mais que os brasileiros em 2015. As empresas e fundos de investimento estrangeiros que conhecem o país há mais tempo estão a comprar porque acreditam na sua recuperação a médio prazo e num sempre apelativo mercado de 200 milhões. Tom Jobim dizia que o Brasil não é para principiantes. Este é o momento para olharmos através dessa cortina de fumo e reservar lugar.
Paulo Lopes Lourenço
Cônsul Geral de Portugal em São Paulo